terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Deus, nossas escolhas e os deslizamentos de terra no Rio de Janeiro


Nos últimos dias todos tem acompanhado com pesar no coração o sofrimento das vitimas dos deslizamentos e inundações na região serrana do Rio de Janeiro. De fato a situação é alarmante e em meio a tanto sofrimento é perfeitamente lícito que o cristão e principalmente o incrédulo se perguntem: “Por que Deus permite que tais coisas aconteçam?”

Antes de tudo quero dizer que você não é nenhum tipo de “fraco na fé” ou “anão espiritual” por se indagar esse tipo de coisa. Uma atitude do tipo “Ah! Eu nunca me faço esse tipo de pergunta. Minha fé me é suficiente!” me parece totalmente arrogante e insensível. De fato, pessoas que declaram esse tipo de coisa estão querendo aparecer em uma espécie de “espiritualidade inabalável” e conseguem, em minha opinião, justamente o contrário pois, demonstram uma falta de misericórdia imensa para com as vítimas. Assim, questionar-se acerca destas coisas não consiste nenhum pecado. No entanto, permitir que este questionamento lhe atormente sem procurar resolve-lo de alguma forma constitui-se num grande erro. O cristão que permite que a duvida e a incerteza habitem livremente sua mente não sabe que tipo de risco esta correndo. Temos de sair de nossas estagnações intelectuais e buscar soluções para lidar com as duvidas que muitas vezes assolam nossos corações. Penso que essa é a função do grande presente que Deus nos deu: o Intelecto. Nesse caso, a Apologética, que tem o intelecto como seu principal pilar, pode nos ser grande aliada para pensarmos questões tão complicadas como esta dos “desastres naturais” (quero deixar bem claro aqui as aspas).

Feitas estas ressalvas iniciais eu quero compartilhar com os ouvintes alguns aspectos que geralmente não são explanados ou lembrados em horas catastróficas como estas. Quero deixar bem claro que de forma nenhuma esses aspectos aliviarão os sofrimentos das vítimas ou de seus familiares, ou mesmo o nosso sofrimento diante de tais acontecimentos. Esses argumentos previnem a geração de mais sofrimento. O sofrimento que estes argumentos podem prevenir é aquele gerado pelo afastamento das pessoas com relação a Deus. Se deixarmos que as pessoas acreditem que tal catástrofe é da vontade de Deus permitiremos a geração de mais sofrimento. De fato, o que todos mais precisamos agora é do conforto do Espírito Santo e não de rejeitar sua fonte.

É um erro gravíssimo do senso comum dizer diante dos infortúnios da vida “Ah, mas fazer o que, era da vontade de Deus que isso ocorresse”. Essa frase transmite e consolida uma imensa falsa impressão acerca do que a bíblia ensina sobre a Vontade de Deus. De fato Deus é onipotente e pode por isso fazer todas as coisas da forma como Ele deseja. Salmo 115.3 diz que o Senhor esta nos céus e tudo fez como lhe aprouve. No entanto, Deus na sua infinita sabedoria escolheu criar seres que tem livre-arbítrio e para que isso ocorresse de fato, para que este livre-arbítrio não fosse apenas nominal, mas real, Deus tem de permitir que certas coisas, muitas vezes terríveis, aconteçam.

O fato latente do livre-arbítrio humano aliado a existência também real e latente do pecado impuseram algumas características novas ao todo da existência neste mundo. Vejamos quais foram estas características:

O livre-arbítrio é a característica ultima do ser humano criado por Deus. O poder de fazer suas próprias escolhas sem ser de nenhuma forma pré-determinado. Ao contrário do que querem alguns essa doutrina esta espalhada por toda a bíblia. Os 4 primeiros capítulos do Genesis já demonstram o fato de que Deus escolheu não influenciar nossas decisões. O diálogo de Deus com Caim é claríssimo neste ponto. Em Genesis 4.7 Deus diz a Caim:

Se bem fizeres, não é certo que serás aceito? E se não fizeres bem, o pecado jaz à porta, e sobre ti será o seu desejo, mas sobre ele deves dominar.

Na verdade argumentar que Deus faz as pessoas escolherem coisas livremente é um absurdo (tenho “vergonha alheia” por irmãos nossos que insistem em apresentar esse argumento). Dizer que alguém te fez escolher algo livremente é como dizer que há um solteiro casado ou mesmo dizer que a famosa bola-quadrada existe. Ambas estas coisas não podem ter existência real, são somente uma combinação errônea de palavras, enfim, absurdos lógicos. Deus não criou absurdos lógicos. Eu e você somos criaturas plenas de uma liberdade de escolha verdadeira e não de um embuste. Se Deus nos controlasse como a marionetes de fato nunca teríamos pecado ao passo que Ele nunca poderia nos ter juntamente com Ele por livre e espontânea vontade.

Dessa forma concluímos que Deus escolheu lidar com os impactos das decisões de suas criaturas! A partir do momento que Deus escolheu criar seres livres é obvio que não seria mais apenas a vontade dEle que ocorreria no mundo mas também as vontades advindas das escolhas desses seres! Surge então um conceito tão interessante quanto desconhecido pelos cristãos em geral: o da vontade permissiva de Deus.

A vontade de Deus e a vontade permissiva de Deus são duas coisas que em grande parte das vezes é bastante diferente. A diferença é muito simples: quando eu peco direi que foi da vontade de Deus?! Ora, isso me parece completamente absurdo. Imagine uma cristã que ao engravidar antes de se casar diga: “Eh.. foi da vontade de Deus que eu tivesse esse filho agora”. É claro que não foi da vontade de Deus! A vontade de Deus sobre a geração de filhos esta expressa na bíblia e é a de que isso ocorra dentro de um casamento. O que ocorre é que Deus não iria mandar um anjo para impedir o ato sexual que gerou esta criança. De fato Deus poderá abençoá-la e perdoá-la, mas é da natureza de Deus que é um Pai amoroso que corrige seus filhos deixar que as pessoas enfrentem as conseqüências de seus pecados. Lembre-se como Deus abençoou e fez grandes promessas a Ismael e sua mãe Hagar, apesar deste nascimento não ter sido da vontade de Deus. Mantenha essa ideia em mente, pois a retomaremos adiante. Assim, Deus pode fazer sua vontade aonde e como quiser, no entanto, o crivo da palavra de Deus nos ajudará a discernir o que foi da vontade de Deus daquilo que Deus permitiu que tenha ocorrido em respeito a sua própria decisão de criar seres com livre-arbítrio.

A segunda característica que influi diretamente na gama dos acontecimentos nesta existência é o pecado. A questão crucial é que em Genesis 2.15 Deus fez um trato com o ser humano; sim um pacto importantíssimo regulamentado por este versículo. É obrigação do ser humano zelar da natureza que Deus criou e desde Adão, infelzimente, nós não temos feito isso. É um preceito sistemático na bíblia que quando o homem pecou a natureza foi drasticamente afetada pela queda de sua coroa. Genesis 3.17 diz que “maldita é a terra por causa do homem” no versículo 18 Deus prossegue dizendo que a terra passará a produzir “espinhos e abrolhos” uma clara metáfora apontando para o fato de que a terra não seria mais pacífica ao ser humano. O apóstolo Paulo escrevendo aos romanos no capítulo 8 verso 22 diz que a natureza geme como se tivesse com dores de parto, sofrendo por conta do pecado do ser humano. Assim, nós encontramos na própria bíblia uma informação alarmante: as chamadas catástrofes naturais são conseqüência do nosso próprio pecado!

Deus continuará permitindo que enfrentemos as conseqüências dos nossos pecados pois, de outra maneira jamais aprenderemos nossa lição. Deus não pode ser culpado por tais acontecimentos simplesmente porque dentro de seus planos não havia catástrofes naturais, Deus não as gerou, o pecado do homem claramente fez isso! Em especial um pecado muito específico que podemos mapear sem maiores dificuldades: A incompetência do ser humano em cumprir a missão dada em Genesis 2.15. Porém, nós não apenas não cuidamos da natureza nós a destruímos.

E agora chego especificamente ao caso da região serrana do Rio de Janeiro. Todos nós nos lembramos de nossas aulas de geografia no ensino médio quando aprendemos que a Mata Atlântica esta praticamente extinta. A maioria de nós hoje se mostra profundamente condoída com o sofrimento que a natureza pode nos causar, mas não dá a mínima importância para o sofrimento que nós temos causado a ela. Choramos com razão os mais de 700 seres humanos que ali morreram, mas não derramamos uma lágrima sequer por cada criatura de Deus que foi arrancada daquelas encostas. De fato é bíblica a idéia de que uma vida humana apenas vale mais que o mundo inteiro, no entanto, também é bíblica a ideia de que era nossa responsabilidade cuidar do lar que Deus nos deu.

Culpar Deus pelo volume desregrado de chuvas que acometeu a região serrana do Rio é pensar que Deus ordenou pessoalmente que cada arvore da mata atlântica fosse derrubada, ou seja, é totalmente absurdo. Ademais Deus não criou um planeta minúsculo, seria de fato culpa de Deus se aquelas pessoas não tivessem nenhum outro espaço para viver, mas isso não é verdade. Essas pessoas não estavam ali por que Deus negou espaço físico para que o homem vivesse, há enormes regiões desabitadas em nosso país e no planeta, basta assistirmos 1 hora de Discovery Channel pra constarmos isso. Quem negou espaço descente para que aquelas pessoas morassem foram os homens. Os homens públicos que negociando votos pleitearam permissões legais para que pessoas, muitas vezes pobres, pudessem construir suas casas em locais de risco. Os dados estão aí para quem quiser ver, inundações causando centenas de mortes na mesma região tem acontecido sistematicamente nos últimos 40 anos. Nós, no entanto, pouco fazemos para que as pessoas não voltem a morar em locais com este. Se fossemos de fato uma nação de maioria cristã, como professam os brasileiros ser, não permitiríamos que pessoas vivessem em locais que tem por nome “Sumidouro” e “Areial”! Os próprios nomes dos locais nos informam de suas características de natureza agressiva.

Por fim devemos nos lembrar que continuaremos a encarar o salário do pecado, mas que, no entanto Deus já solucionou esse problema. Sim, em Jesus Cristo todos aquelas que creram e estavam ali já estão na Glória Eterna desfrutando de uma vida incomparavelmente melhor do que minha e a sua. Ao mesmo tempo o ser humano tem a oportunidade de agir em prol do próximo, ação esta que infelizmente, na maioria das vezes, só é posta em prática diante da catástrofe. Por fim eu afirmo que nada disso precisava ter acontecido. Com certeza Deus usará todo esse mal, provocado por nós, para dele retirar incontáveis bens, mas mesmo assim isto ainda não significa que era seu desejo que tal coisa acontecesse. É hora de nos aproximarmos de Deus, orar e agir em favor das vítimas, não das chuvas, mas das vítimas de uma série de descasos e omissões nossas.

Que Deus nos dê forças para encarar o sofrimento que nossas escolhas tem produzido.